O Festival Balzaquiano de Gramado chegou ao final. Ontem à noite, foram entregues os prêmios da competição. O grande vencedor foi o documentário “Castelar e Nelson Dantas no País dos Generais”, de Carlos Prates. O prêmio foi uma surpresa para todos, afinal o favorito era “Deserto Feliz”, de Paulo Caldas. Contudo, o bafafá causado pela escolha de “Castelar...” como melhor filme foi pequeno em relação aos comentários sobre os problemas técnicos que aconteceram durante o festival.
A organização deste ano visou recuperar o prestígio do festival gaúcho de cinema, perdido já faz alguns anos. Para isso, foi diminuído o número de globais passeando pelo tapete vermelho. A comissão técnica de José Carlos Avellar e de Sérgio Sanz selecionou filmes autorais, que representassem uma parte do que tem sido produzido no cinema de toda a América Latina. Tudo em prol do desenvolvimento da boa cultura do audiovisual.
O tapete vermelho ficou morno, sem muita badalação de famosos. O público que ficava em pé, esperando por uma foto com artistas, debandou por quase toda semana. Apenas no último dia é que apareceram em massa artistas da Globo. Durante a semana, só foi possível ver no tapete um ou outro ator de “Malhação” ou um ex-Big Brother. À primeira vista, parecia mesmo que o festival quer ser levado a serio.
O que atrapalhou o objetivo dos organizadores foram os problemas técnicos de exibição dos filmes da mostra competitiva. Na primeira noite, dia 12, o diretor de "Valsa para Bruno Stein", Paulo Nascimento, recebeu desculpas de Avellar, organizador do festival, por seu filme ter sofrido com a projeção. “Valsa...” teve atacados sua fotografia e seu som na projeção.
No dia seguinte, a cópia em 35 mm do filme argentino “Cocalero”, de Alejandro Landes, não chegou a tempo a Gramado, o que obrigou a sua exibição ser em uma cópia em DVD de baixa qualidade, com selos d’água anti-pirataria. José Carlos Avellar disse, a princípio, que o que o público estava vendo dentro da sala de cinema era, sim, o filme, em 35 mm. Após alguma insistência da repórter Clarissa Londero, ele afirmou que a lata do filme havia ficado presa na alfândega em São Paulo, mas continuou dizendo que a exibição era em película.
Na terça-feira, 14, dia seguinte, a assessoria de imprensa publicou uma nota no site do festival, dizendo que: “A obra só chegou para a Comissão Organizadora em Gramado, apenas às 19h40min do dia 13/8” – sendo que o horário de exibição era às 19h.
Na mesma noite da segunda-feira, o diretor de “Olho de Boi” parou a exibição de seu filme logo no início. Em seguida, ele entrou na sala de cinema informado aos berros que pediu para que interrompessem a exibição porque a “janela” estava errada. A “janela” enquadra a película, inserindo barras de segurança no filme. Com ela, elementos que foram filmados no material bruto não aparecem para os espectadores – como, por exemplo, um microfone, que é escondido pelas “barras de segurança” da janela. Após o recomeço do filme, a sessão continuou normalmente.
Durante o resto da semana, quase todos os dias, o Palácio dos Festivais foi palco para o vexame. “Cobrador”, de Paul Leduc, foi exibido fora de foco. Nos bastidores, o público, críticos de cinema e outros cineastas já até faziam piadas sobre o projetor do cinema. Durante o debate sobre os filmes, na manhã seguinte, a organização pediu desculpas formais aos cineastas, reconhecendo que problemas desta ordem prejudicam a fruição de uma obra audiovisual.
“Problemas como esse acontecem em todos os festivais”, disse o diretor Rudi Lagemann, vencedor do ano da edição do ano passado, com o filme "Anjos do Sol". Filmes que não chegam a tempo é um caso comum em festivais como esse. O que é incomum é acontecer tantos erros como aconteceram esse ano em Gramado.
Com todos esses contra-tempos técnicos, a atenção foi desviada dos filmes-arte escolhidos para o 35º Festival de Gramado. Ou então os filmes não encantaram o público, o que pode ser percebido pelo grande número de acentos vagos nas exibições, enquanto o saguão da sala de cinema do Palácio estava lotado. Apenas o filme “Condor”, de Roberto Mader arrancou alguma reação da platéia: aplausos. Os únicos aplausos da semana que valeram o esforço.
PS.: Um vexame não-técnico
Durante a entrega da premiação da Mostra Competitiva de Curtas Gaúchos, José de Abreu, o apresentador da cerimônia, estava bastante alegre, tecendo comentários ácidos sobre a Assembléia Legislativa – a patrocinadora do prêmio. Um pouco antes, ele também estava alegre pelo saguão do Palácio, dizendo que o Festival de Gramado estava “morto”.
Vinícius Silva França